Dossiê GN’R: A versão de Slash para os fatos: N° 3
Já em 1989, Slash se dera conta de que aquela motivação incentivadora do Guns N’ Roses em se tornar “a banda mais perigosa do planeta” não existia mais. “A necessidade de sobreviver não era mais uma motivação”, afirmou. A monotonia da cena de Hollywood ‘forçou’ Slash a se refugiar mais intensamente na heroína, por exatos dois anos – até 1991. “Eu buscava algum lugar obscuro”, confidenciou.
Àquela altura, os componentes do grupo estavam se distanciando, tanto pelo cansaço das excêntricas turnês quanto pelo acirramento das diferenças sobre os rumos. “As únicas mensagens que recebi deles chegaram oficialmente através da direção na pessoa de Doug Goldstein, que falava sempre com Axl”, detalhou Slash.
O guitarrista aponta que teria de compor e despertar o interesse de Axl para atraí-lo caso todos quisessem ser uma banda outra vez. Mas na ocasião, Slash e principalmente Izzy estavam muito envolvidos com drogas. Só que, com a intervenção de Axl e Slash, o guitarrista-base foi resgatado pelo próprio pai e desde então ficou ‘limpo’ – tem estado até hoje.
De acordo com o guitarrista, ainda assim os integrantes da banda deram um jeito de se reunirem para compor as músicas do álbum sucessor de G N’ R Lies, lançado em 29 de novembro de 1989 com gravações acústicas somadas às do EP "Live ! Like a Suicide". “Estávamos conseguindo compor alguma coisa, criando alguns riffs daqui e algumas partes de músicas dali. Quando estávamos trabalhando, nós nos concentrávamos, mas nunca conseguíamos completar nenhuma de nossas ideias sem todos os integrantes da banda juntos”, descreve Slash.
Conforme explicou o guitarrista, naquele momento todos voltaram a estar concentrados, mas lhes faltara habilidade no que se refere a trabalhar em equipe – até mesmo por não mais viverem e andarem sempre juntos, como nos primórdios do grupo, quando todos se interdependiam para a própria sobrevivência. “Havia a vontade, mas faltava disciplina”, resume Slash. Os excessos com álcool por parte de Slash e Duff incomodavam Izzy naquele instante. “Tenho certeza de que Axl tinha seus motivos para fazer as coisas a seu jeito também”, admite o guitarrista-solo. “Mas não existia diálogo sobre todas essas questões e, como consequencia, havia sérios mal-entendidos”, ponderou Slash. “Em vez de elaborarmos um método novo para resolvermos nossas questões, todos os problemas foram virando uma grande bola de neve”, acrescentou. Isso sim, como o leitor virá até o final, ocasionaria o fim da banda como o mundo conheceu.
Slash explica que o grupo se tornara “disperso” e a dinâmica foi embora. “Não era culpa de ninguém, fizemos o melhor que pudemos”, isentou. “Éramos uma banda fora de controle com algum resquício de inteireza que perdera a habilidade de canalizar tudo de maneira adequada. Simplesmente não falávamos a mesma língua”, sintetizou o guitarrista. Por sinal, tal explicação é mais adequada do que alguns meramente dizerem que Axl deliberadamente ‘acabou’ com a banda. “Todos acabamos sendo omissos”, acusa Slash, para quem faltava comunicação entre os integrantes.
O guitarrista descreve que o cenário de rock de Chicago – onde vivia àquele instante junto de Duff – era bem diferente do de Los Angeles. “Era 1990 e o lugar girava em torno do estilo de música metal industrial de bandas como Ministry e Nine Inch Nails”, abreviou. Como vários anos mais tarde ficaria evidente, Axl captaria tais influências para tentar produzir o ‘novo som’ do GN’R – depois da saída de todos os “originais”, só ocorreria em novembro de 2008 o lançamento do tão esperado "Chinese Democracy".
“O clima entre nós era sombrio demais e não conduzia à verdadeira criatividade”, analisou Slash, sobre o período de composição que antecedeu os álbuns "Illusions". O guitarrista contou que Axl tivera ataques de quebradeira, que descontentaram a Izzy. Mesmo assim Slash admite falha na época: “Quem sabe se tivéssemos ouvido o que ele queria fazer e sido um pouco mais cooperativos Axl não tivesse entrado em parafuso daquele jeito”, reflete.
Slash descreve Axl como portador de um “ar amargurado” aparentemente oriundo de um estado depressivo. Mas o guitarrista frisou que estava mais preocupado com Steven naquele momento. “Andava abusando demais da cocaína e seu desempenho pagava o pato”, elucidou o colega dos tempos de escola. “Compreendi que o caso de Steven se tornava cada vez mais irremediável”, delineou Slash.
O estado de tensão do grupo era grande. “O Guns era uma banda que poderia romper a qualquer segundo”, analisou Slash. O próprio guitarrista destaca no livro que o nível criativo do GN’R caiu drasticamente. “Até Use Your Illusions I e II, o Guns escreveu músicas de uma maneira: a banda começava com uma ideia que qualquer um de nós podia ter tido e, então, todos colaboravam”, esmiuçou o guitarrista. Para Slash, em 1990 o grupo já havia perdido essa inspiração coletiva para produzir. E pelos anos seguintes apenas se arrastou para chegar ao próprio fim.
“Axl e eu tínhamos uma interessante espécie de relação de amor e ódio, sempre tivemos”, especificou Slash. O modus operandi do Guns N’ Roses ruiu e não mais retornou, com Axl mais e mais distante dos demais membros, que também não se confraternizavam da mesma forma que antes. “A tendência de Axl de se comunicar através da direção prosseguiu quando ele retornou de Chicago (para Los Angeles) até os meus últimos dias na banda”, expôs Slash.
Até mesmo a relação com Izzy não ia bem para o guitarrista-solo. Slash o deixou furioso ao passar pelo apartamento do colega e deixar marcas de sangue quando injetou drogas antes de ir para o velório da própria avó, que morrera e o deixou emocionalmente abalado. “(Izzy) Tinha toda razão para estar possesso”, admitiu Slash. “Hoje, analisando esses acontecimentos, percebo como eu era insano e autodestrutivo, mas naqueles tempos não me dava conta disso”, emendou.
O guitarrista ilustra que não fossem alguns shows agendados para abrir para o Rolling Stones o Guns talvez tivesse sido morto pela ‘inércia’. Mas naquele instante Slash teve um pico do uso de drogas, obrigando a própria mãe a orientá-lo a ligar para David Bowie – um antigo conhecido dela – para receber conselhos do experiente músico. A situação se agravou quando Axl implicou com os colegas Steven e Slash pelo uso de heroína. “Há gente demais entre nós dançando com ‘Mr. Brownstone’”, disse o vocalista durante o primeiro show de abertura aos Stones.
Ainda assim Axl aceitou realizar os demais shows, que foram um lampejo de felicidade aos californianos de criação. “Os Stones nos assistiram as quatro noites, segundo eu soube, porque nós os fazíamos lembrar de si mesmos no começo da carreira”, enalteceu Slash. Entretanto, o guitarrista e o baterista da banda se encontravam, segundo o próprio Slash, ‘no fundo do poço’. “Axl teve toda a razão de impor suas condições. Aquele tipo de existência simplesmente não podia dar certo no nível em que estávamos. Quando se é prisioneiro da heroína, a vida não gira mais em torno da música. Eu me esquecera disso”, lastima.
Slash menciona que, devido à empolgação em cantar junto dos Stones, Adler até se sentiu motivado a querer a recuperação do vício em drogas. O próprio guitarrista foi aconselhado a se afastar da badalação da banda em Los Angeles e ficar num resort de golfe no Arizona para melhorar. No entanto, houve apenas o isolamento, porque Slash levaria coca e heroína suficientes para alguns dias.
O resultado não poderia ser outro; acabou causando um grande tumulto ao esmurrar um espelho na busca por atingir ‘animais’ que o perseguiam, em pura alucinação. Slash acabara pisando nos cacos e, sangrando, correu nu pelo estabelecimento de recreação, ocasionando um verdadeiro alvoroço. O episódio quase custou uma prisão ao guitarrista, que regressou à Califórnia.
Assim que voltou, Slash sofreu uma “intervenção” por um ‘comitê’ formado por várias pessoas envolvidas com o GN’R. No entanto, o guitarrista se disse irado com a presença de Adler no mesmo grupo, porque ele também estava extremamente viciado. “Era ridículo que Steven fizesse parte do comitê, porque ele precisava de reabilitação tanto quanto eu, senão mais. Encarei-o com um único pensamento: hipócrita”, disparou Slash. O que se sucedeu foi uma internação mal-sucedida numa clínica em Tucson.
No decorrer do livro Slash reitera que a fragmentação da amizade dos integrantes do Guns ocasionou o fim do grupo como todos conheciam. “Quando começamos a banda, nosso futuro dependia de nossa união forte e espontânea. Nossa atitude gerou uma leal camaradagem entre nós que é muito rara de se ver por aí. O sucesso acabou por fragmentar esse elo ao nos dar aquilo que queríamos e muito do que não precisávamos – tudo de uma só vez”, filosofou o guitarrista. “A sensação era de que havíamos nos esquecido de como fora divertido sermos nós”, completou. Frases como estas resumem muito da razão para o término do GN’R.
A história da banda traria ainda fatos como Slash substituir a heroína pela bebida alcoólica. Ele se unira intimamente ao baixista Duff para compor, mas continuava com preocupação a respeito de Adler. “Nosso caro Steven tornara-se um viciado compulsivo em drogas e achava-se num estado de completa negação. Ele nunca amadureceu para além daquelas fantasias do primeiro grau em torno do rock and roll, nem mesmo quando o risco de perdê-las estava bem diante de si”, analisa Slash.
O guitarrista garante que os membros da banda tentaram auxiliar o baterista a deixar os entorpecentes. “Fizemos o que pudemos para tentar colocá-lo de volta nos eixos, mas não se podia dizer nada a Steven”, explica. Izzy, Slash e Steven tiveram problemas sérios com cocaína e heroína, mas a diferença é que os dois primeiros conseguiram se recuperar. Seguidas internações do baterista não deram certo. “Steven escapou de clínicas de reabilitação 22 vezes”, enumerou Slash, para se ter noção do esforço feito.
À exceção do baterista, o Guns N’ Roses se uniu novamente, por um breve instante, suficiente para criar novas canções e trabalhar em composições existentes que iriam para os Illusions. “Naqueles momentos, a antiga energia voltava e tudo ficava excitante, elétrico”, lembra Slash. O guitarrista enumera como quase todas as músicas do álbum duplo de 1991 foram trabalhadas, num verdadeiro deleite aos gunners.
Naquele instante houve um lampejo de união dos membros da banda. “Ficou claro que, tão logo reservamos um minuto e deixamos toda a besteira de lado, que nos reunimos sem hostilidade, recobramos a vibração, a química da banda”, descreveu Slash, em um tom também de autocrítica. É na gravação dos "Illusions" que se reforçariam as diferenças depois irremediáveis entre os integrantes da banda. O guitarrista mostra descontentamento com a conduta de Axl em todo o processo.
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